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Nos últimos anos, a população brasileira vem sendo exposta a uma alarmante e crescente utilização indevida de hormônios para fins estéticos e de performance.

Esses hormônios, geralmente esteroides anabolizantes (EA), mas também o hormônio do crescimento e outros, são divulgados e prescritos como parte de estratégias para hipertrofia e definição de massa muscular, perda de gordura, aumento da força e disposição física e sexual, para longevidade e para um suposto estilo de vida saudável.

O culto atual ao “corpo perfeito”, considerado como sinal de sucesso, especialmente pela mídia e por artistas, blogueiros, “atletas” e profissionais da saúde não éticos, estimula o uso de EA, independente de sexo, idade e condição cultural e social.

Para tanto, existe um comércio clandestino e extremamente lucrativo, similar inclusive ao comércio de drogas e armas. Novos profissionais da saúde, “desavisados ou ambiciosos” estão sendo atraídos para a área de fitness e estética não ética e usam as redes sociais para estimular, disseminar e ensinar essa má prática, baseados em uma pseudociência.  Pela alta prevalência de efeitos adversos, esse uso indevido tem sido entendido como um verdadeiro problema de saúde pública.

Os efeitos colaterais do uso de hormônios anabolizantes sem indicação clínica específica, em especial sem a sua deficiência confirmada clínica e laboratorialmente, são imprevisíveis, podem ser graves e até fatais. Não existe dose nem supervisão que garante segurança para essa prática.

1) Os esteroides androgênicos anabólicos, mais conhecidos como esteroides anabolizantes, têm como principal representante a própria testosterona, além de derivados sintéticos que tentam maximizar seu efeito anabolizante, de síntese proteica, e minimizar seu efeito virilizante, de características específicas masculinas.

2) A reposição terapêutica de testosterona está indicada em situações de deficiência diagnosticada em homens, quadro clínico denominado hipogonadismo, cujos critérios diagnósticos são bem estabelecidos por diretrizes de várias sociedades médicas publicadas na literatura. O uso da testosterona, também, está indicado para terapia hormonal cruzada no cuidado à pessoa com incongruência de gênero ou transgênero, balizado por evidências científicas e resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM) e do Ministério da Saúde. Em doenças catabólicas extremas, como caquexia e grandes queimaduras, o uso de esteroides anabolizantes pode ser aceito.

3) São alguns dos efeitos colaterais possíveis dos esteroides anabolizantes: aumento de acne e pêlos, queda do cabelo, hepatite medicamentosa, tumores benignos e malignos do fígado, irritabilidade, agressividade, depressão, suicídio, paranoia, alucinações e outras psicoses, dependência e abstinência, aumento do risco cardiovascular por infarto do miocárdio, AVC e tromboses/embolias, com morte prematura (aumento da pressão arterial, alteração de colesterol e triglicerídeos, hipercoagubilidade, policitemia, resistência à insulina, aterosclerose, arritmias, hipertrofia ventricular e disfunção sistólica e diastólica), nefropatia, lesões musculares, abscessos, septicemia e risco de adquirir doenças transmissíveis (AIDS e Hepatite B e C, por compartilhamento de agulhas e sexo não protegido). No caso das mulheres, o uso de anabolizantes pode gerar características masculinas no corpo, como engrossamento da voz, não reversível, aumento do tamanho do clitóris, irregularidade ou interrupção das menstruações, atrofia mamária, infertilidade e teratogênese. Nos homens, o excesso de anabolizantes pode causar aumento de mamas, atrofia testicular e infertilidade.

4) Em adolescentes, o uso pode comprometer a estatura final, por fechamento precoce das epífises ósseas, e desenvolvimento sexual precoce. Adolescentes constituem atualmente uma população bastante suscetível ao uso de esteroides, em especial se tem obesidade ou magreza, ou se sofreram algum tipo de abuso ou bullying.

5) A vigorexia ou dismorfia muscular é uma forma de transtorno dismórfico corporal caracterizado pela crença de que a estrutura corporal do indivíduo é muito pequena e insuficientemente musculosa. A maioria dos portadores de dismorfia muscular usa esteroides anabolizantes e segue uma dieta extremamente rigorosa, geralmente a base de proteínas e dedica muitas horas à prática de exercícios físicos extenuantes.

6) Os implantes hormonais não são aprovados para uso comercial e produção industrial pela ANVISA (exceto o etonogestrel – Implanon – aprovado como anticoncepcional). São manipulados, não possuem bula ou informações adequadas de farmacocinética, eficácia ou segurança. Os desfechos a longo prazo são desconhecidos. Esses implantes hormonais podem conter inúmeras substâncias, embora normalmente sejam compostos por testosterona ou por gestrinona, um progestágeno com efeito androgênico. Combinações contendo estradiol, oxandrolona, metformina, ocitocina, outros hormônios e NADH também são produzidas. Os implantes hormonais não permitem ajuste de dose, controle da liberação e do tempo de atividade.

7) Os usuários de EA acreditam que podem evitar efeitos colaterais indesejados ou maximizar os efeitos das drogas tomando-os de maneiras que incluem: a) ciclos – tomando doses por um período, parando por um tempo e reiniciando, b) associações – combinando dois ou mais tipos diferentes de esteroides e c) pirâmides – aumentando lentamente a dose ou frequência de abuso, atingindo um pico e, em seguida, diminuindo gradualmente. Não há evidência científica de que qualquer uma dessas práticas reduza as consequências médicas nocivas desses medicamentos.

8) Os efeitos adversos podem ainda ser agravados pelo uso concomitante de outras substâncias como hormônio do crescimento para potencializar o efeito anabólico, hormônio tiroidiano para acelerar o metabolismo, gonadotrofina coriônica humana para impedir e neutralizar a redução no tamanho testicular, inibidores da aromatase para evitar ginecomastia, inibidores da 5 α redutase para prevenir a acne e a calvície e diuréticos para evitar retenção hídrica.

9) No esporte competitivo, é reconhecido que os efeitos dos EA, visando melhoria de desempenho físico, de forma ilícita e antiética, ferem os princípios da competição justa e limpa. Seu uso condenado é pelas grandes entidades esportivas nacionais e internacionais. O controle da dopagem vem sendo continuamente ampliado e aperfeiçoado, trazendo com ele as consequentes punições. Essas, infelizmente, podem prejudicar e até interromper, por vezes, carreiras potencialmente promissoras de atletas.

10) A SBEM publicou posicionamento, em 2022, sobre o uso de esteroides anabolizantes para fins estéticos e de performance, disponível neste link. A SBMEE (Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte) também emitiu posicionamento. Em abril de 2023 foi publicada a regulamentação pelo CFM, proibindo cursos e a prescrição médica de terapias hormonais para fins estéticos e de performance. Informação que pode ser conferida neste link .

Consultoria: Departamento de Endocrinologia do Esporte e Exercício – gestão 2023-2024: Dr. Clayton Luiz Dornelles Macedo (presidente), Dra. Andréa Messias Britto Fioretti (vice-presidente) e os diretores: Dr. Cristiano Roberto Grimaldi Barcellos, Dr. Rogério Friedman, Dra. Cristina da Silva Schreiber de Oliveira, Dr. Ricardo de Andrade Oliveira, Dr. Fulvio Clemo Santos Tomaselli.

Fonte: Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) disponível neste link.

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